28 março 2019

Em audiência pública, especialistas alertam sobre desmonte da Previdência


“Se o Estado parar de pagar a dívida pública, as pessoas vão achar um absurdo. Por que se aceita então a possibilidade de o Estado não pagar a aposentadoria?”, problematiza funcionário do Banco Central

Matéria escrita pelo portal da Condsef.

Nem mesmo o PSL, partido de Jair Bolsonaro, tem unanimidade na defesa da proposta de Deforma da Previdência apresentada pelo Palácio do Planalto. Enquanto governo patina nos trâmites políticos de articulação e foge das oportunidades de se debater as regras que quer fazer valer, especialistas de diversas áreas seguem em defesa da Previdência Pública. Para eles, o projeto do governo representa um verdadeiro desmonte da aposentadoria. Na última terça-feira, 26, a Comissão de Direitos Humanos do Senado realizou mais uma audiência pública para tratar do assunto, tão caro à população. O tema específico da mesa, que já debateu previdência rural e aposentadorias especiais, foi o Serviço Público. Ainda estão previstos encontros para tratar dos aposentados e pensionistas, do setor empresarial e da segurança pública.

Participaram da discussão a Condsef/Fenadsef, Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, Associação Nacional dos Juízes Federais do Brasil, Federação Nacional dos Auditores e Fiscais de Tributos Municipais, Confederação dos Servidores Públicos do Brasil, Fórum Nacional Permanente de Carreiras Tipicas do Estado, Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central, Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do Tribunal de Contas da União e profissionais autônomos da advocacia e engenharia. Em todas as falas o tom foi de preocupação e indignação com a proposta do governo.

Não há privilégios

Antônio José de Carvalho Araújo, juíz federal e representante da Ajufe, por exemplo, relembrou que desde 2013 os servidores públicos já estão equiparados aos trabalhadores do regime geral e que não há privilégios no setor. Diretor de Aposentados e Pensionistas do Sindilegis, Ojib Teixeira, reforçou que o servidor público é o defensor da informação e guardião do Estado, que não pode ficar à mercê da alternância de governantes. Para ele, o servidor tem que ter a liberdade de dizer “não” para os governantes, mas a Deforma da Previdência desmonta e vulnerabiliza o Estado. O engenheiro Luís Roberto Pires Junior concorda: “A Previdência pertence ao Brasil, sem ela não se cria País e se acaba com o serviço público. A população tem que ter tranquilidade para envelhecer.”

O Ministro da Economia, Paulo Guedes, não concorda. Durante encontro com prefeitos na última segunda-feira, 25, o principal autor da Deforma da Previdência disse que se a proposta não for aprovada, servidores terão salários interrompidos. Sérgio Ronaldo da Silva, Secretário-geral da Condsef/Fenadsef, avalia a fala como chantagem. “Nós repudiamos fortemente a declaração do ministro. A Lei de Responsabilidade Fiscal está sendo respeitada na integralidade. Os gastos com pessoal não chegam a 40% do orçamento”, explica.

“Nunca na história do País se viu tanto despreparo. A meta deles, que fogem dos debates e se escondem, é destruir tudo o que foi construído. Para onde querem levar o País?”, questiona. Sérgio Ronaldo se refere ao episódio de ausência de Paulo Guedes na CCJ da Câmara Federal, na última terça-feira. Aguardado, o Ministro não compareceu à comissão para debater sua proposta de “reforma”. Para o engenheiro Luís Roberto, a intenção do governo é firmar um pacto com a pobreza dos servidores e dos aposentados. “Desmonta-se o Estado para justificar uma posterior privatização”, observa Sérgio Ronaldo.

O presidente do Fonacate, Rudinei Marques, acredita que, além da sonegação fiscal e do desvio de recursos da Previdência, outro motivo que conduz para uma insistência em afirmar que a Deforma da Previdência é a única solução para todos os problemas do Brasil é a Emenda Constitucional 95, que congela os gastos públicos pelos próximos 20 anos. “O Brasil se tornou o único país no mundo que tem regra de gasto fixo na Constituição. É um absurdo”, diz. Se o gasto com aposentadorias tende a aumentar, mas está em voga o congelamento dos gastos públicos, a solução é a revogação do teto, segundo entidades sindicais.

Constituição

A Previdência é um direito social previsto na Constituição Federal de 1988 e a Deforma de Bolsonaro tira esta responsabilidade da Carta Magna, o que para os especialistas é preocupante pois abre margem para alterações ainda mais profundas no futuro. “A Constituição serve para evitar que o governante da vez mude as regras. Se temos regras previdenciárias na Constituição mas mesmo assim se muda tanto, imagina se tirarmos esse direito da CF? Esse é o ponto principal e não podemos aceitar”, argumenta Jordan Alisson Pereira, do Sindicato dos Funcionários do Banco Central. “A Previdência é um investimento importantíssimo e é a principal política pública de Estado. É uma obrigação do Estado. Se ele parar de pagar a dívida pública, por exemplo, as pessoas vão achar um absurdo. Por que se aceita então a possibilidade de o Estado não pagar a aposentadoria?”, instiga.

Caso o governo aprove a proposta, o resultado esperado é a queda do consumo familiar e o aumento do desemprego, que cresce a cada dia com a última reforma aprovada em 2018. Para Rudinei Marques, o Estado tem que aportar para amenizar as penúrias das classes mais baixas. “As mais prejudicadas são as mulheres, que já sofrem com a desigualdade salarial e de gênero, e que são a maioria das pensionistas”, argumenta.

Comentários Comentar